– Agora não é hora de fazer contos compridos, Bernardo! – disse
Borges, sentado na poltrona de coura à minha frente, acariciando o
tigre.
– Borges tem razão, é! Há que ser um conto – agora! Um daqueles de
momento! – sussurrava, animado, Guimarães Rosa.
Eu
já questionava a ideia de chamá-los. O barulho era tanto que quase
não conseguia me concentrar.
– Não sei o que estou fazendo aqui. É impossível – disse Luis
Fernando Verissimo – não estou morto, como os outros.
– Essa é minha casa e aqui seguimos minhas regras! – gritei. Depois
me ocorreu que estava sendo rude. Mas o livro à minha frente
precisava ser terminado e eu não tinha tempo para me preocupar com o
que era ou não possível.
– É claro, Luis Fernando – disse Borges –, a essa hora estás
dormindo em tua cama, e não aqui. A cidade pode ser a mesma, mas...
imagina! Podias estar até mesmo acordado em teu escritório neste
exato momento, escrevendo, sem saber que também estás aqui ao mesmo
tempo!
– Vai logo, homem! – Rosa me apressava, sem dar bola às elucubrações
de Borges.
– E se ele inovasse na linguagem e em vez de contos, escrevesse
poesias-conto? Algo como contesias? Poemontos, talvez? – sugeriu
Leminski.
Borges
riu, divertindo-se.
– Eu vou fazer um café. Alguém quer? – perguntou Tchécov.
Eu
ia dizer que sim, mas o Guimarães Rosa ficava me cutucando.
– Tá, tá, tá! – gritei, voltando a digitar. Se eles parassem de
dar palpites a toda hora, era bem provável que eu terminasse o livro
a tempo.
Conto do livro Minimundo (IEL, 2006)