12.2.14

Palpites
Bernardo Moraes



 Agora não é hora de fazer contos compridos, Bernardo! – disse Borges, sentado na poltrona de coura à minha frente, acariciando o tigre.
 Borges tem razão, é! Há que ser um conto  agora! Um daqueles de momento! – sussurrava, animado, Guimarães Rosa.
Eu já questionava a ideia de chamá-los. O barulho era tanto que quase não conseguia me concentrar.
 Não sei o que estou fazendo aqui. É impossível – disse Luis Fernando Verissimo – não estou morto, como os outros.
 Essa é minha casa e aqui seguimos minhas regras! – gritei. Depois me ocorreu que estava sendo rude. Mas o livro à minha frente precisava ser terminado e eu não tinha tempo para me preocupar com o que era ou não possível.
 É claro, Luis Fernando  disse Borges –, a essa hora estás dormindo em tua cama, e não aqui. A cidade pode ser a mesma, mas... imagina! Podias estar até mesmo acordado em teu escritório neste exato momento, escrevendo, sem saber que também estás aqui ao mesmo tempo!
 Vai logo, homem! – Rosa me apressava, sem dar bola às elucubrações de Borges.
 E se ele inovasse na linguagem e em vez de contos, escrevesse poesias-conto? Algo como contesias? Poemontos, talvez? – sugeriu Leminski.
Borges riu, divertindo-se.
 Eu vou fazer um café. Alguém quer? – perguntou Tchécov.
Eu ia dizer que sim, mas o Guimarães Rosa ficava me cutucando.
 Tá, tá, tá! – gritei, voltando a digitar. Se eles parassem de dar palpites a toda hora, era bem provável que eu terminasse o livro a tempo.


Conto do livro Minimundo (IEL, 2006)