Raros são os livros de contos – este, com nove histórias não tão breves assim – que revelam tamanha unidade. O movimento do oceano, de Marcella Mattar, nos brinda com uma ficção dotada de atmosfera afetiva e opressiva. Os corações buscam um halo essencial para que seus pulmões e espírito respirem o alívio do encontro. Mas como?
Não é fácil. Em cada trama, seja inoculada por imagens poetizadas, seja por um psicologismo das mais abissais profundezas, vemos protagonistas na delicada relação de distanciamento ou aproximação de um personagem mais coadjuvante, capaz de quebrar um equilíbrio emocional buscado com o arfar de quem necessita de água ou de ar para respirar.
Os abismos aquosos, dentro dos quais os corpos, coleantes, ora chegam perto uns dos outros, ora – feito peixes-homens – encetam a discreta mas decisiva fuga para o grande encontro (consigo mesmo) são os mesmos abismos de ar num céu infinito onde mesmo sem asas o olhar dessas figurações de tamanha sensibilidade e tanta sede ou de amar ou de reconhecer-se arremetam na procura da grande resposta.
Virá? Não virá?
A boa ficção não traz respostas; antes, multiplica as perguntas e o mistério. O movimento do oceano é uma fascinante surpresa na nova literatura gaúcha. Com uma prosa porosa, feito um Proust ou um Henry James, a escritora aqui enceta a mais arriscada e brilhante das viagens – através dos retratos íntimos a partir dos quais nenhum dos personagens consegue boiar na superfície. Quando vêm à tona, é pra ganhar fôlego (junto com o leitor) e outra vez mergulhar até o objeto de desejo ou de enigma proposto. Mergulho ou voo, tanto faz.
A verdade é que nos levam juntos.
Os editores
Do livro O movimento do oceano, de Marcella Mattar (IEL / Corag, 2012)
